História da Epilepsia
A epilepsia é um dos distúrbios do sistema nervoso conhecidos há mais tempo, existindo relatos em papiros datados de 3000 a.C. Porém, o primeiro relato verdadeiramente detalhado acerca da epilepsia surgiu aproximadamente um milénio depois, por volta de 2000 a.C., inscrito num texto de origem babilónica. Apesar disso, o termo “epilepsia” apenas foi referido pela primeira vez na antiga Grécia, traduzindo-se por “ser apanhado, dominado ou atacado”, uma clara acepção ao que muitas vezes se observa aquando de uma crise epiléptica.
Fruto da falta de conhecimento acerca desta problemática, desde os primórdios que a epilepsia foi conotada com entidades espirituais maléficas e divinas. Episódios de epilepsia eram, então, encarados como fruto de possessões demoníacas e castigos divinos, ou até mesmo como sinais de loucura e demência. Diversas crenças e estigmas foram sendo criados e alimentados ao longo dos tempos. Gregos, romanos, árabes, hebreus, bem como muitos outros povos, associaram ao longo dos tempos epilepsia com misticismo, não tendo encontrado explicações concretas nem curas eficazes para este problema.
Hipócrates (400 a.C.), considerado o pai da medicina, e Galeno (175 d.C.) foram os primeiros pensadores da antiguidade a deduzirem que a epilepsia tinha origem não numa ocorrência divina mas sim em ocorrências anómalas localizadas no cérebro. Ainda assim, as suas teorias não foram suficientes para provocar uma mudança relevante no pensamento popular que até então vigorava.
No período da Idade Média, mais precisamente entre os séculos XV e XVI, a Santa Inquisição perseguia os hereges, incluindo os loucos e os portadores de epilepsia, que eram vistos como tal. Muitos epilépticos foram condenados à fogueira neste período.
Ao longo do século XVIII deu-se uma revolução em grande parte das áreas científicas, com novas descobertas e avanços significativos. Apesar de terem surgido algumas teorias que defendiam o cérebro como local de origem para a epilepsia, mais uma vez estas não foram suficientemente fortes para provocar uma mudança de mentalidades. Só no século XIX é que, fruto de estudos na área da neurofisiologia, a epilepsia passou a ser encarada pela comunidade científica como uma doença do foro mental. Um dos principais estudiosos deste século foi Hughlings Jackson, que desenvolveu estudos sobre o cérebro tendo proposto um novo modelo anatómico e fisiológico para a organização, hierarquia e localização das funções cerebrais.
No século XX diversos estudos na área das ciências neurofisiológicas prosseguiram, tornando-se cada vez mais claro e consensual entre a comunidade científica de que a epilepsia tinha origem cerebral. Com a descoberta dos neurónios e das suas especificidades, a epilepsia passou a ser mais compreendida, tendo surgido várias definições para este problema.
Gastaut definiu epilepsia como “uma desordem crónica do cérebro por várias etiologias, caracterizada por crises recorrentes devido à descarga de neurónios cerebrais (…)”. Dreifuss definiu epilepsia como “uma condição em que recorrentes descargas eléctricas no cérebro provocam distúrbios no funcionamento normal do sistema nervoso. Tais episódios são denominados de convulsões (…)”.
Apesar da grande diversidade de definições criadas por vários autores e estudiosos desta problemática, a maioria delas assenta no mesmo princípio básico, podendo ser consideradas complementares entre si, por algumas reflectirem novos conhecimentos resultantes de avanços biotecnológicos mais recentes. Do ponto de vista social o importante é que, embora muito ainda esteja por decifrar em relação à epilepsia, é actualmente consensual que esta tem explicação científica e portanto é primordial aprender com o passado e deixar de discriminar, de uma vez por todas, os portadores desta patologia, algo que tem acontecido desde há vários milénios.
Referências:
LIGA PORTUGUESA CONTRA A EPILEPSIA (LPCE), dez. 2005, História da Epilepsia, disponível em https://www.lpce.pt/dhistoria.htm [acessado abr./mar. 2011]
MOREIRA, Rogério G.M., Epilepsia: concepção histórica, aspectos conceituais, diagnóstico e tratamento. Mental. Barbacena, ano II, n. 3, nov. 2004, p.107-122.